Esse blog anda com cara de quem está entrando numa fase meio que teia de aranha. Tenho alguns posts atrasados, ou melhor devo ao blog alguns posts. Coloco aqui um que já deveria ter vindo parar no seu devido local, isto quer dizer que vai com atraso; como dizem, melhor atrasado do que nunca.
De Belém a Manaus
O Barco Onze de Maio marcado para sair às 18 horas, deixou Belém após duas horas de atraso, portanto a noite já ia avançando quando o barco deixou o cais da cidade e fomos admirando o panorama das luzes que faziam curvas e mostrando na aparência o quanto era belo o brilhar das luzes tão enganador e encantador que atrai tanta gente como se fossem mariposas atraídas pela luz. É preciso da luz do dia para ver a realidade, mostrada nua e crua por uma outra luz, a do sol e a da verdade. Fomos nos afastando e elas foram ficando distantes, pequenas, até se apagarem por completo, quando fizemos a última curva que nos ligava a Belém. Adeus terra dos Cabanos.
A embarcação com sua carga de passageiros no limite, gente vinda de muitos lugares, histórias tão diferentes, agora encontradas por um rio, num barco; tendo em comum o desejo de chegar em algum lugar levado por esse meio de transporte, principal transportador nos infinitos rios da Amazônia. As primeiras horas de viagem fora marcada pela presença em massa dos viajantes na área de lazer. Músicas brega rolando no ar, motivando com suas letras a sensualidade, incentivada pelo teor alcoólico da cerveja em lata.
No segundo dia de viagem, no Estreito de Breves, começaram a aparecer canoas com crianças e adolescentes, umas sozinhas, outras acompanhadas por suas mães, canoas minúsculas, elas equilibradas ali como se fossem a única coisa que sempre tivessem feitas na vida. Todas pedindo, num gesto de cortar o coração, algumas de dois, três e quatro anos. Quanto mais avançávamos mais o número de canoas cresciam, várias pessoas jogavam pacotes com bolachas, roupas e outras migalhas, pois eram isso que elas ganhavam, nossa migalhas.
As canoas que ficavam para trás, formavam uma grande cobra em movimento e iam lentamente desaparecendo aos nossos olhos, ficando como uns pontos perdidos na imensidão das águas. A surpresa maior veio quando umas dessas canoas conduzidas por adolescentes se dirigiram em direção ao barco e numa agilidade de impressionar, prendiam um vergalhão com uma corda na ponta nos peneus e estavam atados a nós; invadiram o barco com suas vendas de camarão, açaí e outras bugigangas. E foram ficando até o final da tarde quando desceram para pegar outro barco que vinha de Manaus e os que estavam nesse outro barco passou para o nosso e foram até noite a alta.
No fim do segundo dia a situação dos banheiros já era lastimável, era entrar nesses compartimentos e sentir o perfume dos nossos dejetos humanos, pra doer nos olhos. Boa parte da manhã de segunda feira, e isso, logos as primeiras horas, não tinha água no barco, esse momento era o ápice das horas das necessidades fecais. Não havia outro modo, era o jeito deixar ali também a nossa parte; sentir a parte dos outros que vieram antes de nós, na certeza de que os outros depois de nós sentiriam um pouco de nós. Da parte que ninguém quer sentir.
O barco ia traçando seu destino, carregando outros ligados a ele e juntos parando em portos de várias pequenas cidades (Prainha, Monte Alegre, Gurupá, entre outras), deixando gente e embarcando outras. Na madrugada de segunda-feira aportamos em Santarén e aí ficamos umas dez horas.
Outro elemento que sai bastante prejudicado numa viagem desse tipo é o rio, tudo é jogado no quintal de água. Dos nossos dejetos humanos aos outros nossos restos, principalmente copos descartáveis. Material que leva algumas dezenas ou talvez centenas de anos para ser destruído pela natureza. Com certeza nosso nível de educação ainda é pouco para convivermos com uma educação ao cuidado desse patrimônio maior da humanidade.
Das diversas conversas que tive, duas delas me chamaram atenção. A primeira com uma família que estava vindo do sul do Maranhão e iam para Boa Vista em Roraima para trabalhar numa fazenda, família formada de mãe, quatro filhos, um casado e um primo, todos jovens no ponto para o trabalho duro, me dizia um deles que estavam indo a procura de uma vida menos dificultosa, onde eles estavam a coisa estava ruim. Uma luta pela comida, o mínimo do mínimo. Nunca tinham ido em Roraima, não sabiam o que os esperava por lá. A outra conversa foi com um vereador de uma pequena cidade do interior do Pará, segundo ele, junto com outros dois companheiros formavam o bloco de oposição na câmara do município e estavam tentando dar trabalho aos outros vereadores e ao prefeito. Levava consigo documentos adulterados por vereadores que tinham sido reeleitos e cometeram irregularidades no mandato anterior; dizia que não tinha nada, mas estava com a honra lavada e que iria continuar sua luta contra a corrupção.
No quarto dia a viagem seguia em sua monotonia, onde a paisagem amazônica parecia ser igual em toda igual. Tivemos que curtir esses últimos dois dias de viagem fazendo um teste a nossa paciência. A chegada em Manaus depois de cinco dias parece ter sido um alívio para todos; a vida em recomeço.
A embarcação com sua carga de passageiros no limite, gente vinda de muitos lugares, histórias tão diferentes, agora encontradas por um rio, num barco; tendo em comum o desejo de chegar em algum lugar levado por esse meio de transporte, principal transportador nos infinitos rios da Amazônia. As primeiras horas de viagem fora marcada pela presença em massa dos viajantes na área de lazer. Músicas brega rolando no ar, motivando com suas letras a sensualidade, incentivada pelo teor alcoólico da cerveja em lata.
No segundo dia de viagem, no Estreito de Breves, começaram a aparecer canoas com crianças e adolescentes, umas sozinhas, outras acompanhadas por suas mães, canoas minúsculas, elas equilibradas ali como se fossem a única coisa que sempre tivessem feitas na vida. Todas pedindo, num gesto de cortar o coração, algumas de dois, três e quatro anos. Quanto mais avançávamos mais o número de canoas cresciam, várias pessoas jogavam pacotes com bolachas, roupas e outras migalhas, pois eram isso que elas ganhavam, nossa migalhas.
As canoas que ficavam para trás, formavam uma grande cobra em movimento e iam lentamente desaparecendo aos nossos olhos, ficando como uns pontos perdidos na imensidão das águas. A surpresa maior veio quando umas dessas canoas conduzidas por adolescentes se dirigiram em direção ao barco e numa agilidade de impressionar, prendiam um vergalhão com uma corda na ponta nos peneus e estavam atados a nós; invadiram o barco com suas vendas de camarão, açaí e outras bugigangas. E foram ficando até o final da tarde quando desceram para pegar outro barco que vinha de Manaus e os que estavam nesse outro barco passou para o nosso e foram até noite a alta.
No fim do segundo dia a situação dos banheiros já era lastimável, era entrar nesses compartimentos e sentir o perfume dos nossos dejetos humanos, pra doer nos olhos. Boa parte da manhã de segunda feira, e isso, logos as primeiras horas, não tinha água no barco, esse momento era o ápice das horas das necessidades fecais. Não havia outro modo, era o jeito deixar ali também a nossa parte; sentir a parte dos outros que vieram antes de nós, na certeza de que os outros depois de nós sentiriam um pouco de nós. Da parte que ninguém quer sentir.
O barco ia traçando seu destino, carregando outros ligados a ele e juntos parando em portos de várias pequenas cidades (Prainha, Monte Alegre, Gurupá, entre outras), deixando gente e embarcando outras. Na madrugada de segunda-feira aportamos em Santarén e aí ficamos umas dez horas.
Outro elemento que sai bastante prejudicado numa viagem desse tipo é o rio, tudo é jogado no quintal de água. Dos nossos dejetos humanos aos outros nossos restos, principalmente copos descartáveis. Material que leva algumas dezenas ou talvez centenas de anos para ser destruído pela natureza. Com certeza nosso nível de educação ainda é pouco para convivermos com uma educação ao cuidado desse patrimônio maior da humanidade.
Das diversas conversas que tive, duas delas me chamaram atenção. A primeira com uma família que estava vindo do sul do Maranhão e iam para Boa Vista em Roraima para trabalhar numa fazenda, família formada de mãe, quatro filhos, um casado e um primo, todos jovens no ponto para o trabalho duro, me dizia um deles que estavam indo a procura de uma vida menos dificultosa, onde eles estavam a coisa estava ruim. Uma luta pela comida, o mínimo do mínimo. Nunca tinham ido em Roraima, não sabiam o que os esperava por lá. A outra conversa foi com um vereador de uma pequena cidade do interior do Pará, segundo ele, junto com outros dois companheiros formavam o bloco de oposição na câmara do município e estavam tentando dar trabalho aos outros vereadores e ao prefeito. Levava consigo documentos adulterados por vereadores que tinham sido reeleitos e cometeram irregularidades no mandato anterior; dizia que não tinha nada, mas estava com a honra lavada e que iria continuar sua luta contra a corrupção.
No quarto dia a viagem seguia em sua monotonia, onde a paisagem amazônica parecia ser igual em toda igual. Tivemos que curtir esses últimos dois dias de viagem fazendo um teste a nossa paciência. A chegada em Manaus depois de cinco dias parece ter sido um alívio para todos; a vida em recomeço.