Coaripolis

sábado, abril 07, 2007

Páscoa coariense
Páscoa significa "passagem", "mudança de vida". Passagem de um regime de escravidão para a liberdade. O mais comum: "da morte para a vida".
É uma palavra hebraica que mais tarde ganha força cristã em Cristo. Seu signifcado de forma mais plena é "vida nova", no sentido de vencer a morte.
A Páscoa é compreendida como superação da morte. Onde a morte é vencida pela vida. No dia-a-dia de nossas vidas, vivemos a páscoa quando vamos superando as ações/atitudes de morte pessoais ou comunitárias e dando oportunidades para a vida acontecer de forma mais plena possível.
Desse modo, onde há sinais de morte, não há espaços para a Páscoa. É preciso vencer os sinais de morte com os sinais de vida para a Páscoa acontecer.
Em Coari com tantos sinais de morte: prostituição, prostituição infantil, gravidez precoce, desmatamento, poluíção das águas, morte do Igarapé do Espírito Santo, pesca predatória, crescente aumento de consumo de drogas (maconha e cocaína), violência, corrupção de todo gênero e o pior de tudo: impunidade; a Páscoa não encontra espaço para florescer na cidade.
Nesses últimos anos da história da terra do gás e do petróleo, uma única vez a Páscoa foi ensaiada e para a surpresa de todos, foi suprimida pela voz da violência, dos casetetes, porradas e balas da Polícia Militar que teve reforço da milícia de Manaus.
Para que as coisas não caiam no esquecimento, vai aqui notícias da melhor Páscoa coariense:



Páscoa é vida nova. É esse o desejo de muitos coarienses, uma nova Coari; com mais vida e esperança, onde ao menos se tenha o direito de morar, nem que seja num tapiri. O desejo e a vontade de construir a Páscoa pelos coarienses está movendo forças, antes desconhecidas. O confronto maior se deu no sábado (26.03.2005) contra a Polícia Militar que fortemente armada com um arsenal de guerra, enfrentava pobres em busca de uma lar.
(texto que escrevi para o post da época)

Cronologia
18/02 - Cerca de 500 pessoas invadem terreno do ex-prefeito Roberval Rodrigues da Silva, de 130 hectares.
24/02 - Outras famílias aderem ao movimento, que já soma mais de 2,5 mil pessoas. Uma nova área, pertencente ao comerciante José Alves de Lima, de 20 hectares, é tomada.
01/03 - Dois líderes do movimento são detidos pela PM e os sem-teto realizam um protesto pelas ruas da cidade alegando que o acordo foi quebrado.
04/03 - Uma reunião entre as famílias e o prefeito Adail Pinheiro é realizada no Ginásio Antonio Mariano, em que Pinheiro diz que não poderia comprar a área invadida, mas cadastraria as famílias necessitadas para a aquisição e doação de uma outra área em um prazo de 90 dias e ajudaria na construção das casas no decorrer de seu mandato.
23/03 - 26 homens da elite do 1º Batalhão de Choque de Manaus chegam a Coari para reforçar o efetivo da Polícia Militar local.
26/03 - A polícia entra na invasão para expulsar os sem-teto, o que causa um conflito com três feridos e 40 presos.
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Violação dos direitos humanos

Por: NeutonCorrêa
A CRÍTICA
Imagens que chegaram ontem à redação de A CRÍTICA reforçam denúncias feitas há dez dias, na imprensa, de que teria havido violação contra os direitos humanos no cumprimento de uma ordem judicial para retirada de um grupo de 2 mil famílias sem-teto de uma propriedade particular, na cidade de Coari (a 370 quilômetros de Manaus). O mandato judicial foi cumprido pelo efetivo local da Política Militar (PM), com o apoio do Batalhão de Choque de Manaus.
As imagens, feitas por um cinegrafista amador, mostram o atendimento às vítimas do suposto confronto entre a PM e os sem-teto, ocorrido na tarde do último dia 26 de março, quando o despejo foi cumprido. O cinegrafista filma o socorro a quatro pessoas. Ele registra imagens da chegada dos pacientes e os primeiros procedimentos médicos dentro do Hospital Regional Doutor Odair Carlos Geraldo, pertencente ao Governo do Estado.
O vídeo de sete minutos tem cenas impressionantes, que provocam horror. A parte mais forte é em relação ao atendimento a dois rapazes feridos à bala, um adolescente de 16 anos, William da Silva Pires, e outro, identificado por um morador da cidade como sendo Eliel da Costa Pereira, 20 anos. Eliel, conforme a gravação, dá entrada no hospital com a perna direita fraturada e o pé balançando. Dentro do hospital, ele grita com dor. Posteriormente, o cinegrafista filma uma radiografia que mostra a fratura nos ossos da perna. Conforme as imagens, o menor desembarca no hospital da mesma ambulância que conduz Eliel.
O tempo todo ele demonstra suportar a dor. O adolescente está ferido na coxa esquerda. O cinegrafista aproxima o foco da filmadora sobre o ferimento: uma perfuração de tiro que atravessa sua coxa lado a lado. O detalhe desse atendimento é que o adolescente chega no hospital e recebe os perecimentos médicos algemado, com as mãos para a costa. Em vários momentos, ele mostra desconforto ao recebe o socorro. Todas as vítimas do conflito chegam no hospital sem a escolta ou a presença de policiais, inclusive o menor algemado.
Quando a reportagem de A CRÍTICA esteve em Coari, nos dias 27 e 28 de março, conseguiu falar com Eliel Pereira, na enfermaria do hospital. Ele contou que o tiro que o atingiu partiu da Polícia Militar. Eliel relatou, na ocasião, um dia após o despejo, que ele e o adolescente não faziam parte do grupo de sem-teto e que estavam retornando de um balneário perto do terreno ocupado.
Essa versão foi confirmada por amigos do garoto, que acrescentaram que ele seria obrigado a passar por ali, porque sua casa fica na mesma rua onde estava ocorrendo a ocupação. O comandante do policiamento, capitão Airton Norte, disse que polícia havia usado apenas balas de borracha.
Caso já está em Brasília
As imagens do caso foram encaminhadas ontem à Secretaria Especial dos Direitos Humanos, da Presidência da República, pela Câmara dos Deputados, em Brasília. Ela foi enviada ao Ministro Nilmário Miranda, por meio de uma indicação feita pela Deputada Federal Vanessa Grazziotin ( PCdoB).
Ela também recebeu uma cópia das imagens. Para a Deputada, a gravação mostra indícios da violação dos direitos humanos. “Isso é um absurdo. Estou chocada com as imagens. As cenas dão conotação de violação dos direitos humanos e os responsáveis devem ser punidos”, disse a parlamentar.
Para o Deputado Eron Bezerra (PCdoB), que quinta-feira passada foi a Coari, as imagens reafirmam o que ouviu da população. Ele disse que o vídeo mostra uma covardia principalmente, ao menor. Ele também criticou o fato de os médicos não terem pedido para que a polícia retirassem as algemas do adolescente.
Conflito foi sábado
O conflito em Coari por causa de terra ocorreu no Sábado Santo. Pelo menos duas mil pessoas participavam da ocupação, segundo os sem-teto.
Eles estavam acampados no local, uma propriedade particular de 150 hectares, há 45 dias. O confronto resultou em 54 prisões, entre elas a do menor.
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PROMOTORIA EM AÇÃO
Imagens serão analisadas pelo Ministério Público
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Obs: Secretário-geral do MP, Elvys de Paula, disse que qualquer notícia de crime será investigada
A Procuradoria Geral de Justiça do Estado (PGJ) vai mandar apurar o caso, informou ontem o Promotor Elvys de Paula Freitas, Secretário-geral do Ministério Público. “Toda e qualquer notícia de crime o Ministério Público vai apurar. Essa é a orientação da Procuradoria Geral de Justiça”, destacou, acrescentando que ontem designou o novo Promotor, Leonardo Abinader Nobre, para chegar as informações.
Ontem, Elvys de Paula, recebeu o relatório preliminar feito pelo promotor Raimundo do Nascimento Oliveira, que na semana passada foi enviado a Coari para colher as informações sobre a situação denunciada por familiares dos sem-teto na imprensa. Oliveira passou à PGJ a informação de que todas ações que ocorrerão na cidade foram dentro das normas vigentes, comentou secretário-geral.
O promotor, no entanto, fez o relato de somente um caso de ferimento à bala e apresentou apenas um documento da delegada de polícia de Coari, Hellen Cristina Pinheiro, contendo o exame de corpo de delito de nove dos 54 presos na ação da ação da polícia militar.
Ele não relaciona entre os feridos Eliel da Costa Pereira.”O doutor Leonardo vai averiguar toda e qualquer notícia de crime de qualquer natureza, seja ela ambiental seja crime comum, violência por parte de quem quer que seja de qualquer cidadão: polícia civil e militar”, garantiu.
Sobre as condições de socorro a que foi submetido o menor dentro do hospital, Elvys de Paula disse que só poderia manifestar-se por hipótese porque ainda não havia visto as imagens.”Não pode um procedimento médico ser atrapalhado por um procedimento policial. É uma questão de bom-senso. Como é que ele esta com a perna imobilizada e ainda ser algemado. Pode parecer uma contradição. Quem estava lá considerou que era plausível colocar as algemas naquela pessoa. O MP vai apurar se houve excesso”, comentou.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Amazonas (OAB/ AM) orientou as famílias que estão sentindo seus direitos violados a procurar a justiça de Coari, onde aconteceu o fato, para denunciar os supostos crimes. Ele disse que a OAB está à disposição para intervir no caso. A secretário de estado da saúde ( Susam), responsável pelo hospital Odair Carlos Geraldo, por intermédio de sua assessoria de comunicação informou que não vê problema na sua aplicação das algemas nesse tipo de atendimento. “Não há problema desde de que não interfira nos procedimentos médicos necessários. O médico não tem poder para mandar a polícia retirar as algemas”, respondeu a Susam, acrescentando que isso esta previsto nas normas.
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Com a descoberta do petróleo e agora com a construção do gasoduto, o município de Coari é o grande atrativo para pessoas de Manaus e de outros Estado. De acordo com a prefeitura, uma forte onda de migração estaria ocorrendo na cidade.
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Três perguntas foram feitas para Francisco Sá Cavalcante, Secretário de Segurança Pública.
1) O senhor recebeu algum relatório sobre o conflito entre sem teto e policiais militares ocorrido no dia 16 do mês passado em Coari?
Recebi sim, informando que os policiais foram designados para cumprir um mandato de reintegração de posse determinado pela Juíza da comarca do Município. Chegando lá, eles (os policiais) tentaram negociar com os sem-teto, mas eles reagiram, alguns armados com armas de fogo, e os policiais tiveram que agir com rigor para fazer cumprir o mandato da Justiça.

2) Na sua opinião houve excesso por parte da polícia na ação?
Não. A polícia usou a força na medida exata e em nenhum momento eles (os policiais) se excederam, a PM usou apenas a força necessária. A ação foi acompanhada de perto pala juíza autora da ação.

3) A polícia usou armas de fogo para reprimir os sem teto?
Pelo que eu fui informado as balas usadas eram de borracha, apenas para controlar a situação. Posso garantir que não houve excesso, apenas a força na medida exata para uma situação tensa que exigiu uma ação eficaz por parte da polícia.

Colaborou: Joana Queiroz
Fonte: Jornal "A Crítica".


Obs.: Essa matéria foi publicada no Jornal "A Crítica" no dia 07 de abril, quinta-feira. O mais estranho de tudo é que nenhum exemplar foi vendido em Coari nesse dia!!!